quarta-feira, julho 28, 2021
Essa não é uma história de amor
Hoje, não tem poema, conto ou crônica, nem mesmo texto fácil e corrido emocionado. Não há espaço para o grito de saudade que eu enforco antes de sair pela garganta, não há lugar para a lágrima que eu engulo antes que possa chegar aos olhos, não há ferida pois cerro o punho e não encosto nas paredes.
Hoje, não tem palavra bonita ou feia ou dolorida ou sublime. Não há uma palavra sequer que possa expressar o horror estampado nos olhos que projeto como se fossem em mim mesma; não há palavra que consiga dizer o que eu sinto e tento afirmar; não tem palavra que comunique o saber que não se está no seu lugar.
Hoje, não tem poema, conto, crônica, texto que indique caminhos a serem cursados, e trabalhos a serem finalizados, e pareceres a serem afirmados. Não tem relatório, prosa ou poesia que dite ao meu estômago que não adianta nada embrulhar, que transcreva no meu cérebro que não adianta nada negar, que tatue em minha pele que não há saídas a pegar.
Hoje, não tem verso que transforme sofrimento em beleza, que diga aos outros que seria bom me conhecer, que dê roupa nova à amargura, que adoce o azedo da vida. Não tem prosa, verso ou canto, não tem trova, brado ou hino, não tem ópera, peça ou choro que core a face novamente.
Hoje, não tem sol que toque minhas mãos e seja capaz de aquecer, fogo que queime as cinzas há muito abandonadas ao léu, sangue que renove o mundo ao escorrer pela face.
(a mão ainda dói dos últimos machucados, eu ainda sofro sem saber como estancar a fonte).
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