domingo, janeiro 15, 2017
Em 2005, escrevi "há sempre uma lágrima entalada na minha garganta: todos se recusam a me olhar".
Lá, o conhecido, o que permanecia, o palpável e seguro me incomodavam, me crucificavam a alma. Os azulejos que eu conhecia todas as manchas, os desenhos que se formavam nas madeiras do forro do teto, o sair e o entrar sempre nos mesmos horários. A rotina me enlouquecia.
Hoje, o sentimento me acompanha: a lágrima está aqui como se fosse lança atravessada no peito sob cuidados médicos cotidianos. Às vezes, dói mais do que o analgésico consegue segurar.
Há sempre um medo constante. Ou melhor, uma angústia constante.
Uma pequena frustração que, às vezes, se sobressai. Um deslize que parece uma grande queda. Uma rachadura quase invisível que decide aparecer quando a água é aquecida. Um abismo sob o tapete com o qual se toma muito cuidado para não cair. Uma fenda que nunca é esquecida e que vez ou outra faz tropeçar. O maxilar que se trava quando, ao acordar, o céu está nublado. Uma chuva fina e fraca que engana quem precisa caminhar pela cidade. Uma dor atrás do olho que não chega a ser enxaqueca e nunca passa. Um aperto no peito que nunca se esvai. Uma lição clara, estonteante e miserável sobre a vida.