segunda-feira, setembro 15, 2008

O Vinícius (http://dizzyrock.blogspot.com/) escreveu, esta semana, um texto acerto-de-contas com o heavy metal em que comenta como rock é uma cultura, antropologicamente falando. Estou longe de discordar. Talvez, hoje, com meu olhar acadêmico (ta, chato, vai!), eu consiga concordar facilmente com seus argumentos. O problema não é que o rock, ou o metal, criem regras, normas, valores a serem seguidos por seus integrantes. Mais que isso, a questão é que os sentidos da vida no rock mudam, tanto para quem o vivencia(ou), quanto para quem entra em seus registros.

Marshall Sahlins, um antropólogo estadunidense, é um dos teóricos contemporâneos a apontar com propriedade que um dos problemas da Antropologia é ter dificuldade de trabalhar com duas variáveis ao mesmo tempo: símbolo (ou, melhor, significados) e história (ou mudança). Nós, na nossa vida cotidiana, provavelmente operemos com os mesmos problemas. Não enxergamos fases a partir da possibilidade de criação de um sentido de vida razoavelmente permanente, ou seja, que se torne ponto-chave da criação de personalidades (esta interação entre o mais íntimo do humano e mundo social). E se tudo isso parece não ter nexo com rock, esperem, que eu já chego lá.

Assim como Vinícius, iniciei minha vida no rock a partir do heavy metal. Eu e minhas amigas saímos para todos os shows que conseguíamos dinheiro para ir – na maior parte das vezes, o único dinheiro que precisávamos era o da passagem de ônibus, já que ou os shows eram de graça ou muito baratos. E nossa conexão, como grupo que compartilha experiências, das mais sublimes às mais conflituosas, foi criada a partir de um pilar essencial: não queríamos nos enquadrar, ser mais algumas no mundo. Não concordávamos com padronizações dos corpos, com o excessivo julgamento moral do exercício da sexualidade e, principalmente, queríamos nos destacar por nossas qualidades mais interessantes, e não por nossos “contatos” (e aqui, entendam desde as relações de quem indica no trabalho ou das ficadas ou trepadas que muitas meninas precisam passar para conseguir alguma coisa num mundo masculino).

Éramos, todas, filhas de famílias que vivem a opressão do feminino nas menores sutilezas (e, Júlia, eu também detesto estas sutilezas), passamos por decepções por fazermos parte deste mesmo mundo feminino e encontrávamos no rock a oportunidade de ser tudo aquilo que o mundo não nos apresentava possibilidade: ali, podíamos estar entre iguais. Até pouco tempo atrás, eu acreditei que o rock era a única forma de salvação de meninas da trágica vida de terem que se tornar frágeis, falar baixo, senão, calar a boca, não se expor, fingir que está tudo bem, e encarnar todos os estereótipos. Mas, como dizia acima, temos dificuldade de avaliar significados ao longo do tempo, em conjunto. Estagnada na minha boa visão de vida que o rock me proporcionou, só fui capaz de reelaborar minha perspectiva quando algo chamou minha atenção, e eu pude recortar o fluxo (Schutz ficaria orgulhoso!).

Ouvi um rumor de que meu sobrinho estava andando com os emos (tudo bem, é ruim, mas é rock) e estava se sentindo mal por um motivo: seus coleguinhas estavam criticando-o por não “pegar meninos”. E aí, caiu a ficha: o rock muda. Se quando meu sobrinho e meu irmão passaram a ouvir metal eu fiquei super feliz, quando ouvi essa história, ah!, meu apreço pelo rock foi [quase] por água abaixo. E como em toda cultura, ruptura de sentido gera experiência do absurdo e necessidade de renovação de significados. Passei a (re)pensar o que significa ser roqueiro para essa geração muito próxima à minha e cheguei à seguinte conclusão: talvez, somente algumas pessoas consigam usar o rock para a criação de uma existência menos cruel. Para outras, talvez, e só talvez, o rock seja só mais uma coleção de normas, fingidas de não regras, de como se comportar no mundo. Gosto de me enquadrar no primeiro grupo, acreditando que os significados são plásticos e que todos podem se encontrar em algum momento no rock como liberdade.

Mas, nem aí tenho certeza: talvez eu seja só uma vira-casaca.

2 comentários:

Vinicius Delangelo disse...

é engraçado voce dizer isso, outra amiga que postou no blog disse: uma cultura potencialmente subversiva se torna um amontado de regras e tal. e foi justamente essa atitude subversiva que me chamou atencao no metal no comeco, mas eh engracado q eu nem lembrava disso ateh ela comentar. pra mim rock virou com o tempo mt mais sinonimo de diversao do qq qualquer outra coisa. perdi toda a esperanca subversiva na parada...

os sentidos mudam, com certeza. adorei o texto, tem um outro post meu que fala sobre esse negocio de mudar com o tempo... http://dizzyrock.blogspot.com/2008/03/este-um-blog-com-opnies-e-resenhas.html

tipo eh engracado vc ter visto no rock essa questao do genero, pra falar a verdade eu sempre achei o rock tao machista quanto qq outro lugar. mas eh legal ver q cada pessoa vivencia a coisa de uma forma particular. e nao deixa de ser subversivo os amigos do seu priminho brigarem pra ele ser gay... hahahahahaha q coisa bizarra.

Marcio disse...

eu sempre vi o rock como um fenômeno cultural estranho que flerta tanto com a rebeldia quanto com o mais conformado capital. há nele, de alguma forma, uma tentativa de concretização do conceito de liberdade. se for pensar que há muitos conceitos de liberdade e que cada um que se aventure pelo rock acaba tentando concretizar o seu, há muitas formas de rock.

eu gosto de pensar que o rock contém algo de juventude que ultrapassa a chatice dos adolescentes. um rock que no fim todos somos jovens porque na roda da história a gente não passa realmente disso.

rrrrrrrrrrock! heheheheh
bjs